Cabellos torrenciaes d'aquella que m'enleva,
Deixae-me mergulhar as mãos e os braços nús
No barathro febril da vossa grande treva,
Que tem scintillações e meigos ceos de luz.
Deixae-me navegar, morosamente, a remos,
Quando elle estiver brando e livre de tufões,
E, ao placido luar, à vagas, marulhemos
E enchamos de harmonia as amplas solidões.
Deixae-me naufragar no cimo dos cachopos
Occultos n'esse abysmo ebanico e tão bom
Como um licor rhenano a fermentar nos copos,
Abysmo que s'espraia em rendas de Alençon!
E ó magica mulher, ó minha Inegualavel,
Que tens o immenso bem de ter cabellos taes,
E os pisas desdenhosa, altiva, imperturbavel,
Entre o rumor banal dos hymnos triumphaes;
Consente que eu aspire esse perfume raro,
Que exhalas da cabeça erguida com fulgor,
Perfume que estontêa um millionario avaro
E faz morrer de febre um louco sonhador.
Eu sei que tu possues balsamicos desejos,
E vaes na direcção constante do querer,
Mas ouço, ao ver-te andar, melodicos harpejos
Que fazem mansamente amar e elanguescer.
E a tua cabelleira, errante pelas costas,
Suppondo que te serve, em noites de verão,
De flaccido espaldar aonde te recostas
Se sentes o abandono e a morna prostração.
E ella hade, ella hade, um dia, em turbilhões insanos
Nos rolos envolver-me e armar-me do vigor
Que antigamente deu, nos circos dos romanos,
Um oleo para ungir o corpo -- ao gladiador.
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O mantos de veludo esplêndido e sombrio,
Na vossa vastidão posso talvez morrer !
Mas vinde-me aquecer, que eu tenho muito frio
E quero asphyxiar-me em ondas de prazer.