Rubrica "Correio do Inferno".

Numa das sempre confrangedoras reportagens do Telejornal albarrânico, desta vez sobre a "PGA", ouvi uma frase que, no café onde eu estava à ocasião, provocou gargalhadas das boas: «após o 25 de Abril, passou a ter-se em conta a inserção sócio-cultural do aluno». Como se isso tivesse sido uma decisão feliz! Experiência atrás de experiência, chegou-se a um Ensino Secundário degradado, onde entre outros vícios se enraíza a convicção de que só vale a pena "estudar para os exames" e não ir às aulas, espalhada por todas as nossas universidades e que, sintomaticamente, esta PGA vem acentuar ao ponto do absurdo.

A frase citada devia fazer-nos reflectir um pouco. O objectivo da Escolaridade Obrigatória, projecto que se iniciou no século passado, é inserir os futuros adultos numa sociedade que espera passar-lhes o testemunho do progresso. À Escola é inerente uma filosofia equalizadora, que se identifica com a dominante sócio-cultural a que pretende assimilar os alunos. Felizmente que a Vida é muito mais do que a Escola (mesmo nos regimes de internato), pelo que cada indivíduo há-de seguir um destino próprio; mas sempre bem-inserido no tecido social de que faz parte, se a Escola cumprir com o seu papel.

Junto com a crise da Família, a Escola de hoje fracassa redondamente, tornando-se até perniciosa na medida em que alberga ritos de iniciação à droga e a outras formas de criminalidade, entre as quais bandos semi-marginais como os "Skins" de que tanto se fala. Não serve de desculpa o falhanço dos projectos de ensino noutros países: a Escola é um problema nacional, diz respeito à nossa sociedade e à nossa cultura. O relativo sucesso do Ensino Particular, mais ou menos evidente consoante os casos, tem muito pouco a ver com a "realidade sócio-económica" dos seus alunos; tem, sim, a ver com a firmeza com que cumpre os seus objectivos, coordenando o trabalho dos professores e tentando dar apoio aos alunos que mostram necessitá-lo.

Não vale a pena deitar as culpas sobre os programas e os livros, e ainda menos sobre os professores, alunos, familiares, etc.; vive-se numa grande desorientação, a que vagas sucessivas de "considerações sócio-culturais" conduziram, esvaziando o conteúdo construtivo de "ir à escola"; esvaziamento que banaliza os diplomas, pois o resultado deste processo é uma cada vez maior percentagem de diplomados ignorantes. A desautorização da instituição escolar dá razão a quem vê nela uma perda de tempo e investe no trabalho infantil. Que retrocesso!

Porto, 18 de Fevereiro de 1992

Paulo de Oliveira