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Entre Irmãos
Hereafter - Outra Vida
Cisne negro
72 Horas
The Fighter - Último Round
O Amor é o Melhor Remédio
O discurso do rei
Indomável
Despojos de Inverno
A rede social
127 horas
Rango
Homens de negócios
Tropa de elite 2
Pina 3D
Ressaca II
A árvore da vida
Rumo à liberdade
Confissões de uma namorada de serviço
A conspiradora
Pequenas mentiras entre amigos
Nada a declarar
Super 8
Os olhos de Júlia
Amor, estúpido e louco
As serviçais
Contágio
Sangue do meu sague
Nos idos de Março
Um método perigoso
Risco duplo
Melancholia
A toupeira
Uma separação
Bruna surfistinha

1Entre Irmãos /Brothers

Segredos de guerra

É natural que, vendo-se o trailer, se vá à espera dum caso de infidelidade (inconsciente de sê-lo) que as filhas do homem traído apoiam. Não passa duma nojenta manipulação, tirando as cenas do seu contexto; e com toda a honestidade, sai um filme até bem melhor. Há vários temas, mas o central é o da vítima de guerra. Desde os que morrem aos que sobrevivem, assim como aos que lhes pertencem. Vemos a guerra que um pai que esteve no Vietname julga ter que fazer, para converter o filho mais novo no que este não é; e vemos a que o Tio Sam julga ter que fazer, para converter o Afeganistão no que não é — vítimas em escalas diferentes, mas com o mesmo tipo de sofrimento. E em nome da sobrevivência, mesmo o impensável se torna possível.
Nesta fita os actores principais são reinventados através destas personagens: Tobey Maguire na dupla face dum fuzileiro cuja bravura será posta duramente à prova, nos olhos expressões como nunca lhe tínhamos visto, Jake Gyllenhaal na dupla fase dum inadaptado que encontra na cunhada e sobrinhas uma porta de saída, magnífico nos silêncios desta personagem, e Natalie Portman no duplo encontro com os dois irmãos, tão próximos e tão diferentes (invulgar beleza tão bem posta em relevo, numa actriz já mais que confirmada). O resto do cast é estupendo, com Sam Sheppard e Bailee Madison (a filha mais velha) em grande destaque (em relação a Clifton Collins Jr., melhores papéis virão). Os ecos de “O Caçador” são bem evidentes, e estão bem actualizados. E, embora nada espectacular, o final é muito bonito. A realidade é que o argumento seria demasiado bom para Hollywood, e no início percebe-se que é uma adaptação dum filme dinamarquês (Brødre, de 2004, com Connie Nielsen). Em suma, apesar das comparações com o original poderem ser desapontadoras (diz-se), não deixa de ser uma estupenda elaboração sobre o poder destrutivo que um segredo pode conter, e da necessidade de libertação desse segredo (e do perdão). Sendo fiel ao original, está bem feito, e vale mesmo a pena ir ver.

2Hereafter - Outra Vida

3Cisne negro /Black Swan

O bailado como drama e tragédia

É uma típica história de auto-superação, mas não termina como é costume; é filme do género fantástico, com q.b. de "cortante", mas tudo não passa de efeitos algo supérfluos; mas... é uma magnífica visão do ballet, não só pela glorificação do movimento e do espírito que leva a uma grande interpretação, mas também pela maneira como nos mostra os problemas de auto-afirmação dos artistas, e a volubilidade do público. Isso sim, juntando as estupendas actuações de Natalie Portman e Vincent Cassel, faz desta fita, se não uma obra-prima, um espectáculo de primeira. Os movimentos da câmara, a visão que dão dos corpos, são fabulosos, e então a cena do Cisne Negro é um feito inolvidável, um cume absoluto de cinema – arte – drama – poesia (e dança!), uma revelação que dá a todo o filme o seu significado. Somos levados a perceber a coragem que é necessária para se chegar à verdade, mesmo que a verdade seja só um momento sublime. De facto, a protagonista, prisioneira do seu mundo cor-de-rosa, é desafiada a ser uma mulher à altura de exprimir o Cisne Negro, e neste papel transfigurador Natalie Portman tem um desafio ela própria, no qual, com a ajuda de Aronofsky e de Cassel, mergulha por inteiro. Magnífica experiência.

472 Horas /The Next Three Days

5The Fighter - Último Round

História e actores valem a pena

Na falta de ideias sobre como fazer um filme diferente sobre boxe, foram buscar mais um exemplo da vida real. Um belo exemplo, diga-se de passagem. E se a história se torna empolgante até à cena da conciliação da namorada com o irmão mais velho, a partir daí entra em piloto automático e perde bastante o interesse. Mark Wahlberg é um bom actor, muito sóbrio sem ser austero, mas quem se distingue são Christian Bale e Amy Adams (os da tal cena), que pertencem a outro campeonato e estão magníficos.
Diz-se por aí que aquela família é disfuncional. Nada mais equivocado, pois nesta família existe amor, há união — pode não haver é muito juízo, e há uns toquezinhos de violência sem consequências, mas de disfuncional é que não tem nada.

6O Amor é o Melhor Remédio/Love & Other Drugs

A receita contra a solidão

O facto dum filme dividir opiniões até pode ser um bom sinal. Eu fui ver este, e não tenho dúvidas em recomendá-lo. Uma história muito bem contada acima de tudo, nunca entrando no óbvio e com uma autenticidade rara das personagens e situações. Está-se num mundo onde todos se defendem de sentir, por medo do que isso possa trazer. Tanto em relação aos outros como a si próprios. E há uma pergunta que parece não ter nada de especial, a que o interrogado, dentro duma banheira, não consegue responder. A busca dessa resposta será a chave para a confiança nos sentimentos. Este filme é uma obra séria, feita com muita generosidade por todos os envolvidos; mas há que querer-se senti-lo.

7O discurso do rei /The King's Speech

Psicologia da voz

Se a personagem de Bertie, Duque de Iorque, que passou a Jorge VI Rei da Grã-Bretanha e demais colónias como se de um pesadelo se tratasse, é em si um motivo de grande interesse, e Colin Firth faz um trabalho fantástico a transmitir-nos essa personagem muito para além da angústia do bloqueio da fala, é a personagem do terapeuta (mais uma obra-prima de Geoffrey Rush, ainda por cima feita com orgulho australiano), e tudo o que ela representa, o mais fascinante. A dualidade do décor da sala de consulta é um autêntico tratado de Psicologia! E dá gosto ver representada a chamada rainha-mãe (Helen Bonham Carter) quando era relativamente jovem, mostrando-nos que até nos antros da realeza (e logo na "firma"!) há Amor, e a realização anti-televisiva (ostensivamente a não caber no formato 4:3), que nos oferece imagens muito invulgares. O melhor filme do ano de 2010 (pelo menos nos padrões de Hollywood), sem dúvida.

8Indomável/True Grit

Demasiado Americana

Admirei neste filme a proeza de conseguir que Jeff Bridges não fosse Jeff Bridges, idem quanto a Matt Damon. Não é só uma questão de caracterização com barbas, bigodes, olhos à Camões, etc.: é uma caracterização "interior", um desenvolvimento das personagens que é, em geral, impecável. A história está muito bem arquitectada, àparte o supérfluo de alguns episódios nitidamente "para encher", e aldrabices como a instantânea secagem da roupa, ainda por cima em época de frio. Mas é um dos melhores filmes dos manos Coen, sem dúvida. Os actores e actriz são todos excelentes, com o bónus de rever-se Barry Pepper.

9Despojos de Inverno/Winter's Bone

Num planeta distante

Este filme tem uma história muito simples, mas como somos mantidos como outsiders, está cheia de mistério. Dependendo dos casos, isso aumenta-nos o suspense, ou então a impaciência. Concebido com meios muito simples, apostando nos actores e na autenticidade das personagens, leva-nos por um mundo estranhíssimo onde ser o xerife não difere em nada do que acontecia no faroeste sem (ou com pouca) lei. Interessante exercício, experiência invulgar.

9aA rede social/ The Social Network

Não é uma história de sucesso

Ainda bem que este filme ganhou uns prémios, assim voltam a pô-lo nas salas e vale a pena aproveitar. Mais do que contar a história do Facebook (verdadeira ou não) através de depoimentos-flashbacks, o que está feito de maneira muito elegante e eficaz, interessa-nos (e às personagens) as aspirações/frustrações dos estudantes universitários, em que o mais jovem "b"ilionário do mundo, Mark Zuckerberg, é como todos, apenas mais um: como conseguir namoro, reconhecimento, popularidade, e (geralmente mais tarde) dinheiro. As aulas são um pretexto, o que conta é a rede social que começa na cabeça de cada um, e à qual o Facebook (como outros) veio trazer uma expressão própria, muito fixe.
São raros os que já a sabem toda e estão em condições de transmiti-lo a quem começa. Parece que foi o caso de Sean Parker, o criador do Napster, que teve um papel de relevo em mais esta revolução. Muito fixe, também.

10127 horas /127 hours

Um filme único e quase perfeito

Filmar a desventura de Aron Ralston, foi um desafio acima de tudo, tanto na concepção da narrativa, onde espreita constantemente a ameaça de monotonia como a do "já visto", como na realização artística, em filmagem, montagem, e em desempenho do protagonista (excelente, James Franco). Vencê-lo foi um feito de respeito: vai-se para a sala com não importa que expectativa, e sai-se com uma sensação dum objecto fora do comum, uma experiência invulgar.
E mais uma vez a lição de vida que representa sobreviver. Só apontaria uma coisa, mas se calhar era pedir demais, no meio de pipocas e cola: não chegamos a sentir o sofrimento físico, sobretudo o da sede. As cenas da água no salvamento são como uma surpresa, e se esse efeito de sofrimento fosse realista para os espectadores teria sido um momento incrivelmente emotivo. Mas àparte isso, é um filme soberbo.

11Rango

Esplêndida metáfora

Quando ficamos a saber o que é guardado no banco da vila, emerge toda uma intenção política, algo que pode vir a ter o seu efeito nos muitos futuros adultos que hoje vêem esta fita. Se nesse aspecto vai ao ponto do atrevimento (adorável!), no da qualidade gráfica bate todos os padrões do género, com texturas surrealmente realistas. Um feito e peras. A personagem de Rango também seduz — uma alma de artista que, sem dar por isso, se faz durão — a lembrar-nos que ninguém sabe para o que é feito. Giro.

12Homens de negócios /The Company Men

Outro lado da crise

Três executivos vêem a crise económica a fincar as garras na empresa onde trabalham. Um deles (Ben Affleck, convincente mas sem brilho) é gestor de raiz, jovem e arrogante, enquanto os outros estão há décadas ligados àquela empresa, onde foram subindo até gestores de alto nível (Chris Cooper e Tommy Lee Jones, este com a melhor interpretação neste filme). Há ainda o cunhado do primeiro, um empresário de construção civil (Kevin Costner) e a amante do terceiro (Maria Bello), que é quem executa os despedimentos na empresa. E o filme acompanha os três percursos principais para levar-nos a um final doce e amargo, mas onde se sente de maneira bem nítida a queda de todos eles. Vê-se com agrado, mas não convence: aquilo não tem nada a ver com histórias reais, é uma amálgama "representativa" de histórias reais, como se de uma ilustração sociológica se tratasse.

13Tropa de elite 2 - o inimigo agora é outro

Intenso e magistral, a saga continua da melhor maneira

Mais uma obra-prima de acção que nos vem do Brasil. Com o BOPE em pano de fundo, só o narcotráfico ficou reduzido, mas o tráfico continua, tendo a agravante de envolver-se com políticos. Nesta ficção de contornos bem realistas, o retrato da corrupção é duma nitidez que não deixa dúvidas, e a imagem do Planalto no fim leva ao que sempre soubemos: o "sistema" manda através dos políticos, os mesmos que o povo é levado a escolher. O que não sabíamos é como, na cena do crime das favelas do Rio, os peões são jogados. E este filme mostra-o duma maneira eloquente, mesmo bela.
Algumas pequenas maravilhas: 1) mostra-se como o reino dos traficantes (neste caso, os do "Tanque") só dura até haver decisão política em contrário; 2) como um activista de direitos humanos (personagem excelente, desempenhada com distinção por Irandhir Santos) aprende a gostar do BOPE; 3) como a cena inicial, interrompida, é retomada.

14Pina 3D

Documentário estupendo embora um pouco maçador

Homenagem a uma coreógrafa/bailarina excepcional (Pina Bausch), baseia-se num punhado das suas criações, com testemunhos dos que trabalharam com ela, algumas imagens de arquivo, e sobretudo a dança, recriada para o cinema e filmada com primor. E com isso fica um documentário único, tão único quanto a artista que homenageia. Pessoalmente, achei que certas secções se prolongavam demasiado, mas compreende-se pois, antes das palavras, eram os movimentos, os corpos, os ambientes, o que tinha de ser visto. Só que a dança é para apreciar com tempo, e o "programa" acaba por ficar pesado. Mas confesso-me abismado com a representação do início do Sacre du Printemps, com que começa o filme. Só para ver este bailado (muito bem filmado), já vale a pena ir ver.
A opção 3D pareceu-me dispensável. O filme, não.

15Ressaca II /Hangover Part II

Baralhar e voltar a dar

Para quem não tenha visto o primeiro, vai ser praticamente tão giro como esse, pois as referências são mínimas e as personagens voltam a ser o que eram. E as fotos finais voltam também a ser o tal apontamento de classe. Mas para os outros, baixa uns furos porque há pouca novidade (o Teddy tailandês e um macaco), embora mantenha a mesma qualidade geral. Acho que mudar de local, mesmo sendo boa ideia, não chegava: as personagens deviam ser outras. A inverosímil entrada do recém-rapper, então, é uma irremediável desilusão, e Giamatti não acrescenta nada.
A série Hangover é um novo conceito de humor no cinema, mas repetir a mesma fórmula, ainda por cima com os mesmos morcões, foi perder a oportunidade de levá-la mais longe. O tiro saiu curto. Pode encher as salas, mas esvazia a lenda.

16A árvore da vida /The Tree of Life

Era preciso ser tão complicado?

Baseado nas recordações dum homem (Sean Penn) sobre a época imediatamente antes de ter morrido um seu irmão num acidente, este filme é (mais) uma longa meditação do realizador e argumentista Terence Mallick: o sentido da vida, de estarmos cá, do devir cósmico. Entre uma filmagem irrepreensível e uma montagem ousada e muito expressiva, encenações perfeitas e recriações gráficas espantosas, é um filme belíssimo. No entanto, prolonga-se demasiado e torna-se chato, apesar disso vale a pena ver. Jessica Chastain no papel da mãe dos rapazes é uma boa revelação (para nós, pois nos States é uma actriz de palco com larga experiência), e Brad Pitt (também co-produtor) entrega-se bem no papel atípico de pai de família, engenheiro com cargo de responsabilidade e autor de invenções, que em casa é o mais convencional dos pais e maridos.

17Rumo à liberdade /The Way Back

Um odisseia contada sem artifícios

É uma história incrível, e muito bem contada. Um punhado de estrangeiros presos no Gulag estalinista, e que estão dispostos a morrer como gente livre atravessando como fugitivos as imensidões da Sibéria e da Mongólia, empreendem uma viagem onde tudo joga contra a sua sobrevivência. Chegando ao ponto de disputarem a presa a lobos, a matarem a sede sugando panos embebidos na pouca água disponível, continuando vivos (como castigo, assim diz "Mister Smith"), levam consigo um criminoso russo para quem a liberdade não é importante. E todos se revelam indispensáveis em tal provação, mesmo que assim não pareça de início, sobretudo com o elemento feminino, de quem o grupo se despede na mais comovente cena de todo o filme.
A rota é (quase) sempre para Sul, e como ela o filme faz-se em linha recta, numa narrativa simples mas habilmente articulada, deixando-nos ver as caras e os corpos, as feridas, a precária união, mas, muito curiosamente, em quem está tão frágil, pouco medo e muita coragem. Como estas personagens são eloquentes no que elas têm (e nós) de mais essencial!
De tal maneira são todos notáveis, que destacar algum actor seria injusto para com todos eles no seu conjunto — mas a fotografia, essa, é excepcional: uma maravilha para os olhos em todos os cambiantes, quer de paisagens quer de grandes planos, que somos levados a admirar.

18Confissões de uma namorada de serviço /The Girlfriend Experience

A banalidade, sem confissões

Se é de Steven Soderbergh, há-de ser bom. E é. A questão é se se gosta. E uma prostituta como protagonista raramente é agradável ao palato, ainda por cima se é num tom de documentário, com as banalidades do dia-a-dia, e praticamente nenhum sexo que se veja! Então para que serve ir ver um filme destes?
Para a beleza um tanto exótica da protagonista (Sasha Grey née Marina Ann Hantzis, uma muito experiente girl de filmes adult), que está presente quase todo o tempo quer com a sua figura quer com a sua voz meio infantil, e que nunca chega a cansar; para ver como a crise financeira no seu máximo de choque (Outono de 2008) estava a afectar os americanos (eles também foram vítimas); para ver este regresso do realizador a um cinema experimental, de baixo cachet e imaginativo...
Acima de tudo, para vermos a maneira como a "namorada de serviço" lida com as máscaras, suas e dos outros. Bem se vê como a mentira é o estado natural em que vivem as pessoas, sempre convencidas da sua esperteza. Mesquinhas. Esta mulher tem o ofício de ser para os homens o que eles querem ver nela, para que eles possam ser "outra coisa" (nem sempre boa) despida dos disfarces do quotidiano. A máscara, durante esses momentos, usa-a ela.
Não é uma fita fora de série, mas é invulgar, é... "The Girlfriend Experience experience".

19A conspiradora /The Conspirator

Injustiça, pela mão da Justiça

Robert Redford, que é um disinto actor, não é menos como realizador, assinando filmes "de fôlego" com uma atenção aos detalhes e uma mestria de encenação invulgares. Neste continua ao mesmo nível, fazendo os seus actores e actrizes estarem ao seu melhor (o que, por exemplo em McAvoy e Kline, é do melhor que se pode esperar). E o realismo dos décors, da caracterização das personagens, das falas e comportamentos, é dum tal rigor que nos sentimos convencidos de estarmos a viver aquele tempo e aquele lugar, ainda melhor do que no já de si notável True Grit.
A história em si, bem... não me seduziu lá muito, confunde-se demasiado com as centenas de filmes de tribunal, com investigação criminal à mistura, ou os de política a interferir com a verdade. Era um tempo traumático, com a Guerra de Secessão ainda a decorrer, quando Lincoln (aqui, acho que pela primeira vez num filme, identificado com tirania) foi assassinado. O que é abundantemente invocado para servir de fundo ao que este filme tem de maior interesse: a noção de que a Justiça (militar ou civil) é uma marioneta ao sabor de quem na ocasião a consegue manobrar — algo que depende apenas da lei do mais forte — onde de nada servem os eloquentes apelos à razão por parte da personagem de McAvoy, que virá a ser um dos fundadores da redacção do Washignton Post (e cuja alegação final é dum brilhantismo digno de ser recordado a quase 150 anos de distância). Esta contorção da Justiça é algo que sabemos existir em todo o lado, mas nem sempre é denunciada como este filme consegue fazer.

20Pequenas mentiras entre amigos /Les petits mouchoirs

Filme de actores e uma bofetada na hipocrisia

Esta é uma das tais fitas que não nos larga mesmo passado um tempo. Na sua maior parte em regime de comédia, na linha do famoso L'Aventure c'est l'aventure, mas com menos glamour (e mais realismo), no fundo é um drama com muitas lágrimas retidas e algumas vertidas (o título original é os pequenos lenços e não podia ser mais certeiro).
Ir no verão à Aquitânia para a casa de férias do amigo Max, com o barco a motor do mesmo amigo atracado na praia de pescadores onde está o amigo Jean-Louis, é obviamente uma rotina imperdível para todos eles, e por isso mesmo a ausência de um do grupo, que nos é explicada no início para que não nos esqueçamos, assume tanta importância. Imperceptivelmente, o que nos parecem pequenas zangas e caprichos vão revelando o trágico de cada uma das personagens, à medida que se acumula o mau-estar inconfessado que a secreta lembrança de quem está ausente vai imprimindo. O ritmo a que isto vai ganhando dimensão é magistralmente arquitectado, não explicitamente mas recorrendo à variada paleta de personagens e respectivos dramas pessoais, para que o tempo nos faça levar a acompanhá-los nesse mau-estar. No fundo, uns mais cedo outros mais tarde, cada um se apercebe do que é realmente importante na vida e trata de, durante as férias pois não há por que ficar à espera, fazer algo por recuperá-lo. Não nos é dito se conseguem, e isso não é importante para nós, de resto.
O realizador Guillaume Canet, cuja craveira como actor ainda recentemente vimos no filme Farewell, tem nos seus colegas actores uma excelente cumplicidade, usando com muita frequência o grande plano, onde os mínimos pormenores da expressão facial não deixam de chegar à nossa atenção. Todos eles sabem "carregar" as suas personagens, cuja complexidade é variável, e em caso nenhum perdem autenticidade. Só é pena que muitas sejam demasiado esquemáticas, mesmo estando presentes a maior parte do tempo, como se a atenção de Canet se centrasse apenas nas principais (as de François Cluzet, Marion Cotillard, Benoît Magimel, Gilles Lellouche e Laurent Lafitte). Por isso talvez se sinta que diversas cenas não estão bem escritas/encenadas, e a sequência final é mesmo um pouco "apressada".
Porém isto são pormenores. O tema do trágico das vidas de cada um é muito melhor abordado nesta fita do que na grandiloquência difusa de Tree of Life, e nos actores mais importantes vemos desempenhos fantásticos. A não perder.

21Nada a declarar /Rien à déclarer

A herança intolerante

Declara-se... um filme cómico, que é divertido e no geral evita a gargalhada fácil. Um posto de fronteira entre a Bélgica e a França serve de palco a uma inteligente charge sobre a xenofobia, que tanto podia ser entre franceses e valões, como entre Braga e Guimarães ou entre FCP e SLB. Exemplos (maus...) não faltam. E, se o riso anda à solta todo o tempo, não deixa de ficar bem claro que o propósito principal é o de desmascarar os mitos que separam seres humanos. E como é um mau exemplo para os filhos estar a perpetuá-los. Não estava à espera deste brinde, e gostei.
Ah!, e no final não esqueceram de lembrar que o caminho a percorrer ainda é longo e difícil, pois a tarefa seguinte é aceitar os chineses. E, embora possa ser um anacronismo para uma história que se passa em 1992-3, em 2010 era obviamente importante. Gostaria muito de ver uma adaptação portuguesa com, por exemplo, Porto e Lisboa... sem faltar porem um lisboeta a imitar a pronúncia da Invicta, claro!

22Super 8

Os miúdos são o máximo

O grupo de miúdos está absolutamente perfeito. É o "nascimento" para a adolescência, onde tudo está a ser aprendido de novo. Por isso vale a pena ver, apenas por isso, diga-se.

23Os olhos de Júlia /Los ojos de Julia

Acaba por ser excelente

Confesso que comecei por irritar-me com o mau gosto dos efeitos usados para causar "terror", demasiado óbvios, demasiado estridentes, com muita falta de classe. E este é o único senão da fita. De resto, é uma história que se vai revelando cada vez mais interessante, esplendidamente desempenhada pelos actores, e com uma realização muito imaginativa, com imensos recursos e feita ao rigor. Repito, só é pena o mau gosto dos efeitos baratos, não havia necessidade nenhuma.

24Amor, estúpido e louco/Crazy, Stupid, Love

Uma boa, mesmo boa, comédia

Esta fita foi muito bem escrita, e tudo o que deriva daí esteve ao nível. As marotices do Cupido com os membros da família Weaver e seus satélites acabam por traduzir-se na antítese das aventuras sexuais, para pôr em relevo a felicidade que há em conhecermos a "alma gémea".
Steve Carell (actor e co-produtor) é o chefe dessa família, cuja reacção ao pedido de divórcio da mulher (Julianne Moore) é a típica dum "tadinho" (wuss em Inglês). A raiva sai-lhe pelos olhos... em lágrimas! Quanto ao engatatão (Ryan Gosling) que resolve dar-lhe uns toques sobre como arranjar mulheres fáceis sem grandes dificuldades, vive a sua própria versão de infelicidade, continuação lógica dum lar onde faltava amor. Para ele, nenhuma das mulheres que ele leva para casa para uma noite de sexo pode ser a "alma gémea", simplesmente porque isso só acontece quando o homem é escolhido, não quando escolhe.
Finalmente, há a rapariga de 17 anos (Analeigh Tipton) que desperta para uma paixoneta pelo pai dos miúdos na vizinhança de quem ela vai regularmente tomar conta, e com quem os pais dela acabam de cortar relações. Tudo becos sem saída, onde aliás se encontram muitas outras personagens. O filme inclui uma cena de revelações que é deliciosa, mas apesar do final-feliz tem o requinte de não resolver tudo. E mais requinte ainda de o protagonista nunca tocar na sua mulher, a não ser em espírito. Há aqui muito bom gosto e sentido de equilíbrio, doses abundantes de bom-humor — diga-se antes: muita classe, e logo num género que muitos consideram "menor".

25As serviçais/ The Help

Tudo é perfeito neste filme

Esta história duma denúncia da arbitrariedade com que os brancos sulistas ainda tratavam os serviçais negros (neste caso as serviçais, ou seja o que nos habituámos por cá a chamar de "criadas"), praticamente um século depois de terminada a guerra da Secessão, é sobretudo um pretexto: o de mostrar a tirania dos privilegiados, que para se manterem como tal vivem em guerra permanente (o "agachanço" é uma cena deliciosa!) de opressão. Há porém alguns que "não se alistam", e há os que cresceram fora desse meio—uns e outros acabam por ser a esperança para os destituídos. O que no fundo nos é dito é: mudem-se as personagens, os meios sociais, as épocas, e apesar de tudo a situação é sempre e exactamente esta. Vejam-se os privilegiados de hoje.
Só que este pretexto é extraordinariamente gritante: hoje já "custa" justificar-se a opressão a que assistimos—as tintas fortes do esclavagismo "actualizado", na capital do estado mais retrógrado dos States, são difíceis de suportar. Mas não deixa de fazer-se alusão a outros privilégios, como o de Nova Iorque em relação à "província", isto é da editora em relação à segunda protagonista (Emma Stone), que sendo da classe privilegiada em Jackson é explorada por quem não compreende o que ela tem de enfrentar, e nem quer saber disso. É sempre ingrato ser-se charneira, de resto...
A primeira protagonista é a mulher "órfã de filho" que, sem grandes motivos para viver, é a primeira a "falar". É mais um desempenho supremo da excepcional Viola Davis, nela se concentrando todas as emoções, toda a determinação, todo um frágil equilíbrio que lhe permite continuar a viver. Neste argumento multifacetado e de muitas personagens, a confrontação final repõe a ênfase nesta personagem que, de serviçal, passou a escritora.
Haverá coragem de atribuir o óscar de melhor actriz a Viola Davis, logo neste filme?
Fotografia, realização, montagem, actores e actrizes, tudo é perfeito nesta fita, mas acima de tudo é a história e aquilo que nela temos de saber ver o que a torna magnífica.

26Contágio/ Contagion

Não é grande coisa

Gosto do ritmo da narrativa, cada cena está muito bem dramatizada, a realização é de mestre (como se esperaria de Soderbergh), os actores estão ao seu nível (o que é muito bom neste elenco de estrelas). Mas a história é fraquita. É um género algo estafado, desta vez optando-se por nos dar uma espécie de reportagem, distanciada, neutra até, e onde se aproveita demagogicamente para lançar umas achas à fogueira da desconfiança no governo e nas autoridades sanitárias (a desautorização do blogger é demasiado discreta). E dispersa-se por muitos pólos, tornando as ideias demasiado superficiais ou então subliminares, ou seja ineficazes. Seria demasiada coisa para um filme desta duração, se tivessem feito algo mais longo talvez ficasse bem melhor. Este realizador seria capaz, mas não quis?
O que faz suspeitar que se apostou em nomes sonantes para encobrir a falta de ideias e de empenhamento da produção. Uma treta de filme, portanto. Opta por ser demasiado verbal, o que lhe rouba muito do impacto, usa separadores com a contagem do dias como recurso baratucho (ou apressado), e há muitas inconsistências. Não devíamos sentir o medo dentro das personagens? Não devíamos sentir o alastramento da doença sem ser só por números? Não devia explicar-se como as cidades ficaram fantasma? (e onde pára a polícia?) Não devia morrer menos gente nos primeiros infectados? E no contraponto com a realidade: comparadas com as revoltas de Tottenham em Agosto passado, as cenas de pilhagem/ desenfreamento encenadas até parecem de crianças, e a "explicação" final até parece visar um branqueamento da gripe A. Há muita coisa mal pensada, ou então pensada a fazer de nós parvos. Ainda não chegámos a isso, pois não?
Mas o que realmente me irritou é a persistente preguiça dos legendistas, que não traduzem SARS para pneumonia atípica, ou clusters para focos. Ou é mesmo só ignorância?

27Sangue do meu sague

Muito bem esgalhado

Esta história tem duas protagonistas: as duas irmãs Márcia (Rita Blanco) e Ivete (Anabela Moreira), que embora vivam na mesma casa são como duas linhas paralelas. E as outras personagens desta casa oscilam entre estas duas linhas, cada uma com os seus problemas, problemas que advêm de uma só e mesma coisa — a pobreza. Cada filho de Márcia (Cleia Almeida e Rafael Morais) pende para a sua forma de ilusão dum futuro melhor, seja pelo romantismo ou pela esperteza, e é por eles que o enredo se enleia.
Não sendo um filme extraordinário, tem coisas notáveis e é de caras o melhor que se viu produzido em Portugal desde há muitos anos. O profissionalismo sente-se por todo o lado, os desempenhos são estupendos (mas o gangster de Nuno Lopes consegue ser o mais impressionante), os diálogos (que o argumentista/realizador teve a feliz ideia de deixar serem aperfeiçoados em colectivo) são, ao menos por uma vez, excelentes...
Mas acima de tudo o que me deixou de boca aberta é a qualidade da captação sonora, a dar-nos a esperança que este filme faça escola e possamos esquecer a necessidade de pôr legendas para perceber o que as personagens dizem na nossa língua!

28Nos idos de Março/ The Ides of March

Vê-se

É um bom argumento, é um lote de bons actores e actriz muito bem dirigidos, é um bom realizador (Clooney); mas o tema é algo pobre, e há cenas que não "pegam", como aquela do encontro secreto à beira-rio; Clooney (actor) debita umas banalidades sobre deixar-se a dependência do petróleo, e toda a questão do compra-e-vende de votos também é banal. Só se salva, no que tem de trágico, a misteriosa personagem de Steven (Ryan Gosling), no seu transe de vender a alma ao diabo. As circunstâncias são mais uma vez banais, mas é nesse ponto que este protagonista aceita o seu destino e o preço que isso acarreta. Com mortos e feridos.

29Um método perigoso/ A Dangerous Method

História com H grande

Que título mais infeliz, mesmo vindo dum dos livros que serviu de base a este filme! Nestas personagens da vida real, retratadas com merecido realismo — e é muito justo o relevo dado à russa Spielrein neste processo de desenvolvimento da psicanálise — está uma imensidão de fascinantes possibilidades, do choque hiperenergético que estes encontros teriam de implicar.
Só a vivência do sofrimento mental (sem implicar loucura, e Spielrein sabe que não é louca) pode levar à transformação, e aí reside a diferença de Jung em relação a Freud: ao contrário deste, não se fica por ser um espectador, e graças a isso intui a possibilidade de realizar o acto médico da cura, através dessa coisa perigosa que é o encontro consigo mesmo; Freud preocupa-se mais em consolidar a sua ciência na respeitabilidade social — conseguiu-o, mas à custa duma "desinfecção" do método (que em si mesmo não é perigoso), limitando os seus horizontes, e este filme explica-o muitíssimo bem.
Dificilmente poderia escolher-se melhor realizador que Cronenberg. A direcção de actores é só por si uma obra-prima, desde a extremamente burguesa Srª Jung (Sarah Gadon) ao sempre solitário seu marido (Michael Fassbaender) e respectivo Mr. Hyde (Otto Gross, personagem histórica muito mal retratada, mas o trabalho de Vincent Cassel é estupendo), desde o egocêntrico Freud (Viggo Mortensen) à apaixonada Spielrein (Keira Knightley). O melhor realce possível para isso é manter os ambientes dentro do mais banal, sem recorrer alguma vez a tiques "expressionistas". Muito, muito bom.

30Risco duplo/ Drive

Filme ousado, merece todos os perdões e louvores

Muitos irão estranhar este filme. Mas a ideia é mesmo a de ser um filme totalmente àparte. O argumento até é bom, mas isso não é tão essencial como é a maneira de fazê-lo filme. Diversas coisas serão de valor discutível, mas o risco do realizador é o nosso desafio, e aceitá-lo é perceber o desejo de oferecer-nos uma obra de arte que não só faz pensar, mas é arte, sobretudo. Tarantino construiu a sua reputação neste território, e tem aqui um sucessor de grande mérito, o dinamarquês Nicolas Winding Refn.
A brutalidade de várias cenas é provavelmente mais chocante que a dum filme de terror: é inesperada, não tem meio-termo, sente-se. Não menos terrível é o retrato da maldade que se vê a vários níveis: penetrante e impiedoso, não deixa margem para quaisquer atenuantes. E é claro, há duas sequências de perseguição automóvel que são mesmo excepcionais!
Dois avisos: nos States, a atenção da polícia sobre um criminoso dura apenas até ocorrer outro crime a seguir; e lá, desde que se conte a história certa, disparar a matar pelas costas pode ser legítimo. brrr...

31Melancholia

Pegue-se pela ponta que se quiser, é obra de mestre

A ponta que eu prefiro é dos rituais: a primeira parte dilacera os duma boda, a segunda os da morte esperada. E vai dizendo muitas coisas terríveis, às vezes sem que no momento lhes sintamos o impacto. É por isso que será desmerecê-lo sair da sala com uma ideia feita, e pronto a esquecê-lo. Porque é uma obra feita com imensa seriedade e amor, e com a maior arte. E então a sequência inicial, a lembrar quadros surrealistas ao estilo de Dalí, uau!
Agora se percebe a tentativa desajeitada de Terrence Malick de realizar uma "meditação cósmica" sobre a vida. Assim se vê o que é não chegar aos calcanhares de Lars von Trier, certamente o mais significativo realizador dos últimos 25 anos.

32A toupeira/Tinker Tailor Soldier Spy

As encenações da espionagem

O mundo da espionagem, neste caso durante a Guerra Fria nos anos 70, é todo feito de ilusionismos, de enganos. Em suma, é onde reina a encenação. John le Carré (que aparece na hilariante cena do pai natal soviético) como que faz uma compilação de encenações, onde as personagens são, à vez, encenadores, actores ou espectadores. Um mundo fascinante, perigoso e paranóico. Mas esta fita faz-nos sentir completamente por fora do que se passa, dando uma sensação de desconforto que se arrisca a alienar o público mais do que envolvê-lo: a acção demasiado fragmentada, o excesso de subentendidos, os alinhamentos difíceis de compreender, sendo fiéis ao estilo de le Carré, e decerto eficazes a passar-nos o ambiente de risco permanente, são uma onda onde nem todo o público se sente bem. Dentro do que se pretende cinema de grande público, roça o pretensioso, o que é pena. Mas note-se que isso é mais um problema de expectativas do grande público, demasiado habituado a formatos previsíveis; em nada tira ao elevadíssimo nível técnico e artístico desta fita.
Gary Oldman é um actor extraordinário e encontra-se aqui com um papel muito bom, enchendo a sua actuação de pormenores deliciosos, mas é Colin Firth quem, em crescendo na parte final, causa uma maior impressão. Mais que isso, vale o conjunto dos actores, que nos trazem as personagens cruas, solitárias, dos soldados da Guerra Fria. Notável.

33Uma separação/ Jodaeiye Nader az Simin

Enredados em teias de mentira

Esta fita ultrapassa até o Eyes Wide Shut de Kubrick, na reflexão sobre o casamento — sem recorrer à infidelidade, de resto. O que aqui vemos, àparte os detalhes do modo de viver no Irão, é um tema universal feito com imensa arte. A cascata de acontecimentos trágicos sucede-se, com reviravoltas e revelações criteriosamente doseadas e programadas, numa história que poderia passar-se em qualquer país, e em qualquer época.
A maior questão que fica, é se a separação já existia e só precisava de pretextos (a filha de ambos, e o pai do marido), ou se cresceu apenas das teimosias do casal (note-se o requinte da frase da filha, para o pai: «deixa-a pensar»). O magnífico plano final dos pais sentados à espera, separados por um guarda-vento aberto e sem se encararem, também nos deixa sem resposta. Esse mistério dá-nos a opção de completarmos a história.
É um filme adulto, que ninguém adulto deve perder.

34Bruna surfistinha

O que a prostituta vê

Depois dum prelúdio com Raquel, a primeira parte é sobre Bruna, e sempre a subir. Depois vem a surfistinha (que, de surf, só o da net), para no fim voltarmos à Raquel — que teve a bênção de ter descoberto o que era importante na sua vida, ou seja o que a fez tomar o caminho que tomou. Percursos como este poderão existir aos montes, mas desconfio que raros são os que têm um final feliz, e ainda mais raros os que passaram para a literatura. E o público que vê tem assim a oportunidade de ver as coisas do lado da prostituta, aquilo que tem de prisão e de libertação ao mesmo tempo.
Deborah Secco faz um belo trabalho, já como actriz de telenovelas ela era muito mais do que um corpo escultural e um par de olhos muito expressivo. Só a acho menos bem a fazer de adolescente, culpa de menor atenção tanto da "maquiagem" como, sobretudo, da direcção. Para além dela, há um belo lote de actrizes, e actores, uma realização em geral muito competente onde o filme nunca perde o ritmo, intercalando sabiamente as cenas em voz off com as dialogadas.
Vale a pena ver, para quem não tiver preconceitos com "a mais velha profissão" e seus pormenores, entre o sórdido e o divertido.

Nazaré

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